Paulo Schmitt, procurador-geral do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), é o delator-mor do futebol brasileiro.
Tanto poder em suas mãos trouxe efeitos colaterais para o procurador-geral. Dizem que logo cedo, ainda antes de acordar, o estimado jurista tem balbuciado palavras que, de início incompreensíveis, foram sendo decodificadas por pessoas próximas como sendo a sua sentença-padrão: “Vou solicitar as imagens para oferecer a denúncia ao Tribunal”. Que imagens? Que denúncia? Que tribunal?
Ora, ora, pouco importa, senhores. Importa, isso sim, que nada mais acontece neste decrépito futebol brasileiro sem que Schmitt se apresente como o bastião da moral e dos bons costumes, sem que venha apresentar denúncias descabidas, sem que venha exigir, de antemão, providências contra torcidas, clubes, jogadores, técnicos, dirigentes e demais personagens.
Mas Schmitt não está sozinho. Longe disso. Em sua cruzada destemida em defesa da moral e dos bons costumes, tem como parceiro o presidente do órgão: Flávio Zveiter, o jovem sucessor de uma família de tão inestimáveis serviços prestados ao futebol brasileiro (foi seu pai, Luiz, o responsável pelos 11 jogos anulados do Brasileiro/2005). O Zveiter mais novo, no entanto, é ainda mais repressor que seu pai e seu tio, figuras de notória passagem pelo referido tribunal. Sinal dos tempos, é claro.
Schmitt e Zveiter vêm transformando o futebol brasileiro em algo insuportável. Não é de hoje, é bem verdade, mas 2013 tem sido um ano particularmente propício para os arroubos verborrágicos dos doutos expoentes do STJD. Não disponho dos números aqui, mas eles certamente comprovariam a afirmação a seguir: nunca antes foram registradas tantas e tão descompassadas punições contra clubes de futebol. Nunca houve tantas perdas de mando de campo e tantos atletas sendo punidos por atitudes supostamente contrárias à ética esportiva. Nunca houve, enfim, tamanha interferência de um órgão de burocratas boquirrotos no esporte que outrora se praticava apenas dentro das quatro linhas.
Isso tudo para não mencionar a evidente falta de critério em algumas decisões - a depender das agremiações envolvidas.
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O quê? Tacaram um copo de água na cabeça do bandeirinha? Perda de um mando de campo!
Como é que é? Torcedores trocaram sopapos na arquibancada? Multa e menos dois jogos como mandante!
Eu escutei direito? Vândalos organizados e baderneiros entraram em confronto com os nobres, valorosos e destemidos homens do 2º BP Choque? Pois que joguem quatro vezes seguidas no interior!
Ah, não diga isso! Resolveram não separar duas torcidas que se odeiam e os caras brigaram? Que marginais! Portões fechados pra os dois times! Ah, essa punição não está no Código? Bom, então que percam quatro mandos cada e não se fala mais nisso!
Alô, Rizek? Vou bem, e você? E aí, vai fazer o que hoje à noite? (...) Como é? Ele forçou o terceiro amarelo e admitiu isso na entrevista? Vamos meter gancho nesse vagabundo!
O que é que ele disse? Sério? Não posso aceitar essa manifestação desrespeitosa a este órgão tão essencial para o futebol! Vou solicitar as imagens para oferecer a denúncia ao Tribunal!
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Por obra de Schmitt e de Zveiter, por exemplo, a maior cidade do país quase não vai ter futebol neste final de temporada. Todos os seus times grandes vêm sendo punidos de maneira vazia e inconsequente sem que medidas práticas tenham sido tomadas – e sem que os verdadeiros culpados pelos incidentes tenham sido inquiridos.
Observem, senhores, que nada que vem do STJD tem caráter corretivo e/ou de efetiva punição para os responsáveis pelos atos (quaisquer que sejam eles). As medidas ora tomadas contra os clubes têm o efeito perverso de punir milhões de pessoas enquanto os poucos responsáveis diretos nada sofrem – e, via de regra, são até beneficiados, uma vez que podem encarar as viagens para terras longínquas sem que isso lhes cause grande contratempo.
O próprio Palmeiras passou um terço da Série B sem poder jogar na sua cidade. Foram duas penas por situações distintas, mas fato é que os envolvidos nos tais incidentes que provocaram a punição continuaram indo aos jogos em outras cidades e estados. Situação similar ocorre com o SCCP e com o SPFC – isso para não falar nos tantos clubes punidos Brasil fora. Aliás, não deve haver sequer um participante das divisões principais que tenha escapado da ensandecida cruzada dos senhores juristas.
Agem, o procurador-geral e o presidente do STJD, não com vistas a aplacar eventuais situações indesejadas, mas com foco exclusivo na punição pela punição. Um pouco porque gostam de aparecer (qual dessas proeminentes figuras do direito não gosta?) e outro tanto porque movidos por um irrefreável desejo de denunciar e punir por qualquer besteira. É coisa que vem de berço, sabem como é?
Calma, Schmitt, calma; logo mais você recebe as imagens para denunciar a próxima vítima. E tudo segue como antes, rumo a um futebol a cada dia mais e mais insuportável...
Fernando Véjar
Há 4 horas