27 junho 2010

Soy Argentina (y Uruguay)!

Tem um monte de nego por aí que torce contra a Argentina "só por ser contra a Argentina". Não há argumento lógico, não há um histórico a justificar isso, não há coerência alguma entre o que se diz e o que se faz. O que existe, além de desinformação do povão, é uma rivalidade artificial, alimentada por setores retrógrados, engraçadinhos ou puramente preguiçosos da nossa mídia esportiva. Isso se reflete, por exemplo, em certas propagandas televisivas, muitas das quais apenas utilizam o reconhecido apreço do brasileiro pelo humor simplório para fazer piadinhas nada esforçadas.

Os hermanos, pelo contrário, apostam na exaltação do amor pelo pátria e pela seleção, qualquer que seja o momento. Nas vitórias ou nas derrotas, nas comemorações ou nos momentos de tristeza. Os outros países aparecem apenas como coadjuvantes, pois o que importa é o amor próprio, a certeza de que se está fazendo de tudo para que o seu país seja o vencedor.

No Brasil, as vitórias são tratadas com doses de arrogância injustificada ou como mera ocasião para festejos fora de época. Já as derrotas são vistas como oportunidade para fazer piadas, destruir ídolos ou mesmo criar teorias conspiratórias que sobrevivem ao passar dos anos. O brasileiro não hesita em se autodestruir, em derrubar aquilo tudo que foi construído, só para fazer graça. Aí joga-se tudo na conta do “bom humor brasileiro”. Ah tá. Eu sou mais um tango mesmo, um drama que convém mais ao espírito do futebol.

A própria mídia esportiva de cada país é um reflexo da sua população. É por isso que uma campanha que exalta o espírito guerreiro (sim, estou falando da Brahma) é prontamente rechaçada pelos nossos valorosos e indignados jornalistas, que chegam a estabelecer um vínculo entre o "ser guerreiro" e a violência nos estádios. Balela! Coisa de gente hipócrita, de falsos moralistas, dos juquinhas dos nossos jornalões ultrapassados.

Na Argentina, por sua vez, os comerciais já são concebidos para traduzir o sentimento do argentino pela sua seleção (e, acima disso, pelo país). Deixo-os com alguns exemplos, os mais óbvios, só para começar a comparação:









E aí? Entenderam agora o porquê de eu torcer pela Argentina?

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"Soy Argentina", mas não só. "Soy Uruguay" também. Os motivos são bem parecidos com os que me levam a torcer pela Argentina, mas eis que o grande Flavio Gomes, no último sábado, conseguiu resumir tudo em um único (e brilhante) post. Aqui vai, na íntegra:

SONHO CELESTE
*Por Flavio Gomes

Não se pode ter medo de vencer. Essa é a lição que nossos hermanitos uruguaios devem absorver depois da vitória sobre o samsungs agora há pouco na encharcada Porto Elisabeth. Fizemos 1 a 0, recuamos, e acabamos cedendo à correria desembestada da Hyundai de Baixo. Aí aprumamo-nos e pimba.

Foi um pouco do retrato do que são esses dois países. A Coreia aceleradíssima, com seus néons, suas TVs de 3D, seus Tucsons e Souls, sua economia emergente, exuberante, alucinada. O Uruguai em marcha lenta, que para para tomar chimarrão, que contempla o rio da Prata, que não tem pressa, que deixa o tempo passar porque, afinal, ele vai passar de qualquer jeito, ninguém consegue ser mais rápido que ele.

Ah, Uruguai… Dos pequenos quiosques, da Patricia, de Gardel, do Peñarol, de Punta, do Buquebus, dos antiquários, das feirinhas nas ruas, do Mercado do Porto, dos carrinhos velhos rodando valentes, dos domingos preguiçosos, dos táxis pretos com capota amarela, da bola que rola orgulhosa no Centenário… Não, não dá para torcer contra um país que tem duas Copas, dois ouros olímpicos, que fez o primeiro Mundial lá longe, em 1930, mesmo diante dos esforçadíssimos olhinhos puxados que correm feito loucos e têm nomes de calça lee e sobrenomes com hífens.

A Coreia do Sul nem vai perceber que saiu da Copa. Amanhã suas fábricas despejarão no mundo milhões de carros, TVs e aparelhos de som, países como esse não param e não se dobram a uma derrota no futebol. O Uruguai, não. Nosotros precisamos dessas coisas.
Aguante!

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E as cervezas do Uruguay também mandam bem na hora de mostrar o amor do povo pelo país. Isso sim é patriotismo:





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Vocês entendem agora a vergonha que eu sinto a cada vez que ouço um grupo de brasileiros cantar "Eu sou brasileiro/ Com muito orgulho/ Com muito amor"? V-E-R-G-O-N-H-A! O Brasil não tem torcida em eventos assim; o que o Brasil tem é um agrupamento de pessoas patéticas fazendo um país inteiro passar vergonha.

24 junho 2010

Dunga, a Globo e a Copa de 94

A Folha de S.Paulo de hoje oferece bons subsídios para um novo post na mesma linha do anterior. Vejamos, ponto a ponto: 

O jornal, que nunca escondeu o seu ressentimento com as atitudes e declarações do técnico da seleção brasileira, estampa na capa do caderno de esportes o seguinte enunciado: “Com seu estilo truculento, suas convicções e manias, Dunga doutrina a seleção sem ser contestado por jogadores e comissão técnica”. Isso, na visão da FSP, tem até nome: dunguismo. Aí o jornal procura justificar essa premissa, e é até bem-sucedido. Ok; o ranço dos jornalistas da Folha contra Dunga é notório e eu sinceramente não vou contestar o direito deles de manifestarem isso e criarem suas próprias teorias. 

Na mesma página, o jornal publica os “Dez Mandamentos do dunguismo”. Como o conteúdo é fechado e considerando que essa tabela nem apareceu na versão online, publico logo abaixo para apreciação dos leitores.

 

Meu veredicto: exceção feita ao 6, aí colocado com indisfarçável dose de ironia e maldade, eu concordo com todos os demais mandamentos. Destaques para o 2 (“Nada de privilégios à Rede Globo”), ao 5 (“A imprensa é sempre inimiga”) e ao 10 (“Mais importante é ganhar, não jogar bonito”). 

Vejamos que, na mesma página D3 em que foi publicada a tabela, a Folha traz uma outra matéria, com o título “Técnico testa Júlio Batista e Daniel Alves”. Um breve trecho é o que importa: “A Folha acompanhou parte do treinamento secreto do alto de um prédio próximo à faculdade Saint Stithians, em Johannesburgo.” Malandrinhos os enviados especiais, não? Entenderam o “mandamento 5”? 

Mais importante, no entanto, é o mandamento 10. Na mesma página D3, Paulo Vinicius Coelho manda bem (ou quase) na sua coluna de hoje. O título? “Não era Dunga”. O colunista procura desmistificar a imagem de Dunga como um jogador tosco e repara uma incorreção histórica ao dizer que “A opinião pública não questionava sua presença, em 1990. Dunga merecia ser titular. Quando seu relógio marcar 13h36, portanto, uma injustiça histórica completará 20 anos. Nessas duas décadas, Dunga se livrou do rótulo colado em sua testa no Mundial da Itália. Os livros de história não revelam um brucutu. Neles está a imagem do capitão do tetra, levantando a taça, como líder da seleção brasileira.” 

É bem por aí: nego passou esse tempo todo falando mal do cara, criou uma era supostamente negativa com o seu nome e agora vem se sentir injustiçado com os maus tratos e com a falta de educação dele? Quer dizer que nego pode avacalhar, xingar, estigmatizar e depois não aceita a postura combativa (e essencialmente pragmática) do treinador da seleção? É realmente de foder! 

Do bom texto de PVC, me permito extrair um parágrafo extremamente significativo: “Difícil dizer se o ressentimento de Dunga tem mais a ver com o fato de ter virado símbolo da derrota de 90 ou com o Brasil jamais ter aceitado a vitória de 1994. Se tem a ver com a inócua discussão sobre a preferência nacional ser por vitórias como a de 1994 ou derrotas como a de 1982.” 

Para matar a questão de uma vez por todas: eu não sei vocês ou o resto dos brasileiros, mas eu aceito sem qualquer ressalva a vitória de 1994. Foi uma vitória belíssima, de uma seleção exemplar, que protagonizou algumas partidas notáveis (a vitória sobre os EUA, na casa deles e com um a menos, os 3 a 2 sobre a Holanda, o sofrido 1 a 0 contra a Suécia, mesmo os 3 a 0 sobre Camarões). Foi uma grande Copa, uma grande seleção, um grande momento do futebol brasileiro. 

Foi uma seleção que, depois de duas décadas de derrotas, fez o que precisava fazer. Foi em busca de um objetivo, entendeu que o futebol não é essa viadagem idealizada por Armandos Nogueiras da vida, mostrou fidelidade a uma concepção tática, alcançou as vitórias que precisava passo a passo. Fez sete jogos, ganhou cinco, empatou contra uma complicada Suécia (1 a 1, belo gol de Romário) e depois na final contra a Italia. Marcou 11 gols e tomou apenas 3. 

(A própria Copa de 94 é uma injustiçada. Foi uma Copa com final disputada por dois gigantes. Teve uma decisão de tricampeões. Foi uma Copa de jogos memoráveis, de grandes feitos, de alguns times brilhantes. Uma Copa de uma Bulgária em fase unicamente brilhante, de uma Romênia de Hagi, de uma Suécia consistente e com um folclórico Ravelli no gol. Uma Copa de um Maradona injustiçado, de gols notáveis, de estádios enormes e lotados, de um país que precisava ser conquistado pelo futebol. Foi a Copa de Romário, o maior craque daquela década.) 

Podem chamar de “Futebol pragmático”, “Futebol de resultados” ou como bem entenderem. Eu chamo de “Futebol vencedor”. Ao contrário de outras decantadas seleções de Copas anteriores, a de 1994 venceu. E convenceu. Fez o que dela se esperava, e o futebol é acima de tudo uma competição que adquire um caráter bélico a depender da visão de cada um. Querem espetáculo? Pois que façam bom proveito do circo, do teatro ou de qualquer dessas artes. O futebol não é nada disso. 

Assim, ao contrário do que afirma PVC, eu aceito a seleção de 1994. Aceito a vitória (de um tempo onde eu ainda torcia pelo Brasil), o time, Dunga, Romário, Parreira, até o Bebeto. Aceito aquela conquista, cada gol, cada jogo, cada vitória, cada passo rumo a um título que as poéticas seleções anteriores deixaram escapar em meio às aspirações fantasiosas de um futebol como espetáculo. 

Se Dunga é um símbolo da vitória de 1994, eu estou com ele. Mesmo sem torcer por esta seleção atual, me coloco ao lado do treinador da seleção nessa batalha contra a Globo e contra toda a ala reacionária e hipócrita da nossa imprensa esportiva. Porrada neles, Dunga!

15 junho 2010

Deixem a Copa em paz!

Republicando hoje um post de quatro anos atrás:

Post original (14.06.2006)

O lado ruim da Copa

Pessoas me encontram e querem saber o que eu achei da vitória do Brasil, qual é a minha opinião sobre os jogos da Copa, quem são os favoritos ao título. Fazem isso como se eu estivesse agora em êxtase, empolgado com o torneio que é sem dúvida o que existe de mais importante no mundo dos esportes.

Até estou. Mas não consigo colocar isso para fora. E a culpa é dos oportunistas de plantão, daqueles que “só gostam de futebol durante a Copa”. Gente assim impede que eu consiga manifestar todo o meu apreço por cada um dos 64 jogos (sim, até Arábia Saudita x Tunísia) do Mundial. E aí eu acabo represando o que sinto.

Faço essa introdução em respeito àqueles que ficaram assustados quando respondi onde iria ver a estréia da seleção brasileira: “No meu quarto”, disse. Ao que ouvi: “Mas sozinho?”. “Sim, sozinho”, encerrei.

Pois bem, é fato que eu não estou acostumado a torcer pela televisão. Meu lugar é no estádio, na arquibancada. Sou um torcedor na acepção do termo e não apenas um espectador. Não me sinto à vontade, portanto, para torcer à distância. Logo, não torço.

Se não torço, assisto ao jogo. Admiro, avalio, estudo. E tais ações são inconcebíveis ao lado de certas pessoas. Por quê?

Porque pessoas falam. E falam muito. Merda sobre merda. Palpites estúpidos, comentários inoportunos, análises idiotas.

Sou incapaz de manter a calma quando o futebol é vítima de quem não o compreende. De quem, sem saber porra nenhuma, julga ter direito a emitir opiniões. Pior: de quem não o quer bem, mas abre exceção durante um mês. É impossível a convivência entre estes seres e eu.

E é aí que chegamos ao meu quarto. Ele tem muitas qualidades. Tantas que eu seria incapaz de enumerá-las aqui. Mas uma se sobressai: ele me permite ficar distante das pessoas que não deixam o futebol em paz.

***

O mundo não está perdido

Não estou só. Aliás, não estamos, pois sei que muitos leitores deste blog compartilham desta minha linha de pensamento. Deixo-os, por fim, com dois textos que complementam tudo o que escrevi acima.

1. Folha de S. Paulo (08/06/2006)
Coluna de José Geraldo Couto


Abaixo os ETs
Aproveitadores de plantão e torcida de última hora irritam amantes do futebol

O poeta e cineasta italiano Pier Paolo Pasolini, católico e comunista, escreveu certa vez que na época do Natal desejava fugir da Itália e ir a um país não-cristão, para escapar do massacre da propaganda e do "espírito natalino" que, segundo ele, pervertiam o sentido religioso da data.

É mais ou menos isso o que sente o amante do futebol em tempo de Copa do Mundo. A overdose de imagens dos craques, a proliferação de bandeiras, a insistência monotemática da mídia e da publicidade, o patriotismo compulsório - tudo isso, que irrita quem não gosta de futebol, incomoda também quem gosta muito.

Nada desagrada mais ao torcedor aficionado do que ouvir de alguém a frase: "Eu não ligo para futebol, exceto na época da Copa". Invasores. Alienígenas. Gente que não conhece nem as cores dos principais times do país.

Em tempo de Copa do Mundo, o verdadeiro amante do futebol se sente acuado por uma massa de ruidosos diletantes, de amadores ineptos que caem de pára-quedas à beira das quatro linhas.

Quando o torneio finalmente começa, depois de semanas de oba-oba da mídia, temos pelo menos o consolo dos jogos propriamente ditos. Alguns são muito bons, outros são emocionantes e há até os divertidos, sobretudo na primeira fase, com tanto time ruim.

Mas o verde-amarelismo onipresente, a estridência dos locutores, a idiotice dos comerciais, o oportunismo dos políticos - tudo isso só consegue revoltar e causar engulhos em quem realmente aprecia essa arte performática.

Que não me entendam mal. Presenciar uma Copa do Mundo é uma experiência incomparável. Não estou, daqui do meu canto, dizendo que essas uvas estão verdes.

O problema é ver o futebol ser conspurcado, manipulado, inflado e saturado no chamado país do futebol. A bem da verdade, pouco me importa se o Brasil será campeão ou cairá fora na primeira fase. Só quero ver, se possível, no meio de tanto marketing e tanta politicagem, um pouco de bom futebol


2. Placar (Junho/2006)
O homem mais irado da cidade,
por José Enrique Aznar


A Copa é a maior invenção da humanidade. Sem ela, a vida não faz sentido. Até quem odeia futebol, em tempo de Copa, se envolve com o assunto. E é isso que me irrita. É um monte de Zé Mané palpitando, achando que entende alguma coisa...

Outro dia fui ao banco e uma senhora roliça pegou uma tabelinha que a mulher do caixa ofereceu:
-Ai, que dia o Brasil joga?
-Dia 13 estréia.
-Ai, é terça, que chato... E o outro?
-Não sei, tá aí na tabela.
-Ai, é dia 18. É domingo, dá pra fazer um churrascão... Porque com esse time é claro que vai ganhar, né? Ronaldo, o Kaká tão lindinho...
-Eu gosto do Raí. Ele vai?

Tive vontade de vomitar. Paguei a conta e fui pra casa. No caminho, vi um monte de gente com camiseta verde-amarela. Aposto que ficam dando palpite nos esquemas, mas a maioria não sabe do que tá falando. Nessa Copa vou me trancafiar e ver todos os jogos e mesas-redondas sozinho. E não vou botar o nariz na rua, porque meu ouvido não é penico, caçarola!

13 junho 2010

Felipão, 10 anos depois...


21 de junho de 2000, Morumbi. Nos pênaltis, depois de um 0 a 0 no tempo normal, o Palmeiras perde o bicampeonato da Libertadores da América para o Boca Juniors. Felipão, já com sua saída quase acertada, conduziu ali o alviverde em sua última decisão efetivamente importante em 10 anos. Felipão foi embora, correu (e conquistou) o mundo, ficou distante por uma década perdida

Sem ele, o Palmeiras perdeu força: colecionou derrotas inacreditáveis, viu recordes e marcas históricas caírem ano após ano, deu vexames antes inimagináveis, desperdiçou títulos ganhos, perdeu muito de sua identificação com a vitória. 

A impressão é que, ainda hoje, pagamos caro por aqueles anos todos, por cada noite histórica sob o comando de Felipão, pela vitória sobre o SCCP em 2000, por tantas glórias acumuladas. 

Mas o Palmeiras, enfim, parece reencontrar o seu caminho: Felipão voltou. Voltou não apenas para ser o técnico de um time que não se encontra há tempos, mas para restituir o Palmeiras ao seu lugar de direito. Felipão está de volta não só para ser o nosso comandante, mas para colocar novamente do mesmo lado jogadores, diretores e torcedores. Voltou o homem que nos ensinou a ver o futebol de um modo diferente. Com ele, volta também o Palmeiras que conhecemos.

*** 

O título do post foi pensado ainda cedo, por uma dessas confusões com as datas (elas eram antes tão mais precisas para mim...). O caso é que o Palmeiras foi eliminado pelo Boca da Libertadores também na véspera de um Corpus Christi e aí sim em um 13 de junho (como hoje), mas isso foi em 2001 e não em 2000 (este foi mesmo em 21 de junho). Daí então eu passei a acreditar que a volta se daria exatamente uma década depois daquela perda. Veio o título do post, que, mesmo sem a data precisa (fui perceber isso agora), faz sentido. Foi aí que me dei conta de outro detalhe, mas aí precisamos voltar 17 anos no tempo: 13 de junho de 1993, um domingo como este de agora. Ainda moleque, acordei cedo e fui à banca de jornal perto de casa para comprar todos os jornais do dia. A manchete principal da Folha de S.Paulo daquele domingo ficou para sempre na minha memória: "Morumbi, 17 anos depois...". Neste domingo, passados outros 17 anos, o palmeirense bem poderia ser recebido com uma outra manchete: "Felipão, 10 anos depois..."

10 junho 2010

O ídolo, a casa, o povo


Tomo a liberdade de emprestar as fotos publicadas originalmente pelo Seo Cruz lá no necessariamente polêmico Cruz de Savóia. Elas trazem também um pouco do brilho que tem faltado a este blog e, mais que isso, ao torcedor palestrino e ao próprio Palmeiras. Tivemos ontem uma tarde histórica no Palestra Italia. Não pude ir, é evidente, mas estive bem representado pelos amigos vagabundos e pelo irmão idem. Nem mesmo uma tarde de trabalho impediu que cinco mil dos nossos tomassem aquele que foi o nosso lugar por muitas décadas. Nada de cartão de crédito, de setor mercantilizado, de oportunistas de fase final ou de cadeirinha numerada; ao menos por ontem, a arquibancada central foi nossa uma vez mais. Bastou que um ídolo voltasse para que a multidão corresse de volta para sua casa. Para a nossa casa. Sim, ontem o Palestra foi a nossa casa como há muito tempo não era. Sem Castilho, sem Capez, sem a corja fardada, sem os crápulas que nos querem tomar o futebol. O Palestra foi a casa de cada palestrino. Como lembrado pelo grande Galuppo (e aqui eu empresto também mais um pouco do que foi publicado pelo Seo Cruz), as bandeiras foram desfraldadas novamente dentro da nossa casa 15 anos depois. Bandeiras, fumaça, festa, o povo em liberdade. O verdadeiro futebol voltou à nossa casa. O Palmeiras é nosso. Temos um ídolo de volta; Kleber é um dos nossos.



Quer mais fotos e também o relato de quem esteve lá no Palestra? Pois corram para o Cruz de Savóia.

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Palestra, começo dos anos 1990:

Palestra, 09.06.2010:

09 junho 2010

Olê, olê, olê, olê, Kleber, Kleber!


O trabalho me impede de ir ao evento que marcou o retorno de Kleber ao Palestra, mas lá estive muito bem representado por muitos dos meus amigos vagabundos e pelo meu irmão, outro vagabundo que deu as caras no Palestra em plena tarde de trabalho. Foram cinco mil nessa condição, e eu os deixo com a foto primorosa do Seo Cruz. Ao menos por uma tarde, a Mancha voltou ao seu lugar de origem – um retorno simbólico, diga-se. O meio da arquibancada foi novamente ocupado pelos nossos. Foi como se eu estivesse lá! Seja bem-vindo de volta, Gladiador!

07 junho 2010

O Palestra em -10 jogos

Tivemos lá atrás o post sobre os (meus) 20 jogos do Palestra, como se fosse possível resumir em duas dezenas de partidas as alegrias que tivemos na nossa casa. Acontece que um torcedor de verdade é forjado não nas grandes conquistas, mas essencialmente nas derrotas acachapantes, nas noites de vergonha, nas tardes que contradizem toda a nossa grandeza. Um torcedor de verdade se constrói não nos títulos, alguns dos quais se prestam à ostentação oportunista, mas nas derrotas inesperadas. Dessa forma, sinto-me impelido a escrever o post de agora, com os 10 jogos mais tristes, decepcionantes ou trágicos da história recente do nosso estádio.

O critério é o mesmo do ranking anterior: valem apenas os jogos com a minha presença (ou seja, todos menos quatro da última década). Uma coisa é certa: eu não perdi nenhum que seja significativo (para o bem ou para o mal). Aí vai a lista:

10. Palmeiras 1 x 1 Nacional/URU
Copa Libertadores/2009 (28.05.2009) - 24.700

Pode parecer estranho abrir a série com esse jogo, mas é que nunca um técnico foi tão responsável por um mau resultado do time. Depois de todo o esforço feito para chegarmos às quartas da Libertadores, o Madureira conseguiu levar o Nacional ao empate no Palestra. Na volta, até viajamos a Montevideo para buscar a vaga, mas não dava para compensar os erros do jogo da ida.

9. Palmeiras 2 x 6 Fluminense/RJ
Campeonato Brasileiro/2001 (07.11.2001) - 6.289
Pelo placar, sintomático da derrocada que tivemos naquele ano. Querem mais? O jogo foi disputado numa quarta-feira à tarde.

  8. Palmeiras 4 x 4 Santo André/SP
Copa do Brasil/2004 (20.05.2004) - 14.983
A Copa do Brasil daquele ano estava nas nossas mãos. Aí fomos ao ABC e arrancamos um empate em três gols. Na volta, a eliminação só viria com uma derrota ou com um improvável empate em quatro gols. Abrimos 4 a 2, mas conseguimos tomar dois gols, o segundo aos 44 minutos da etapa final. Uma eliminação como só o Palmeiras poderia conseguir no seu estádio.

7. Palmeiras 2 x 3 SPFC/SP
Copa do Brasil/2000 (27.06.2000) - 13.730
Não foi tanto pela eliminação, pois a anterior, seis dias antes, pela Libertadores, tinha sido muito mais dilacerante. O que doeu aqui foi receber oSPFC na nossa casa e ter que aceitar a presença de Evair, o nosso ídolo eterno, com a camisa tricolor.

6. Palmeiras 1 x 1 Flamengo/RJ
Campeonato Brasileiro/2002 (13.11.2002) - 29.478

O Palmeiras pressionou, lutou, batalhou, tentou o segundo gol de todas as formas. Mas o time não tinha qualidade e ficou no 1 a 1. Deixamos o Palestra naquela noite com uma quase certeza: o empate poderia custar caro. De minha parte, era certeza mesmo: tínhamos caído para a Série B ali mesmo, em casa, confrontados com a nossa própria incompetência.

  5. Palmeiras 2 x 3 Cruzeiro/MG
Campeonato Brasileiro/1998 (26.11.1998) - 29.950

Conquistamis dois títulos contra o Cruzeiro naquele mesmo ano (a Copa do Brasil, em maio, e a Mercosul, em dezembro). No meio disso, no entanto, essa derrota dolorida. Depois de uma grande campanha na fase classificatória, perdemos o primeiro jogo no Mineirão (1 a 2). Aqui, no segundo jogo, um domingo à tarde, vitória pelo mesmo placar. Dois resultados iguais, melhor campanha na primeira fase, classificação à semifinal, certo? Errado; o estúpido regulamento previa mais um jogo, dando sobrevida ao time de pior campanha. Noite de quinta-feira no Palestra: o Cruzeiro abre 2 a 0, duas vezes Marcelo Ramos (sempre ele!). O Palmeiras, valente, busca o empate na raça: 2 a 2, gols de Almir e Paulo Nunes. A vaga foi nossa até os 43 minutos do segundo tempo: aí Müller avançou pela direita e cruzou para a área. Fábio Jr., outro dos nossos carrascos, deu um tapa na bola: 2 a 3. Uma derrota que doeu fundo na alma.

  4. Palmeiras 2 x 7 Vitória/BA
Copa do Brasil/2003 (23.04.2003) - 8.722
Os números dizem tudo. Como se não bastasse, estávamos prestes a encarar a Série B. Parte da torcida abandonou o estádio no intervalo, em procissão fúnebre. Eu fiquei por lá até o final. Não por nada, mas por que faltou força para sair antes.

  3. Palmeiras 1 x 2 Cruzeiro/MG
Copa do Brasil/1996 (19.06.1996) – 29.139
O time dos 102 gols, das goleadas sem a viadagem do atual time do Santos, das 27 vitórias em 30 jogos, do ímpeto ofensivo sem firula, do Madureira no auge. Isso tudo não resistiu à saída de um único jogador. Müller se foi, o time dormiu naquela noite fria, Amaral falhou, depois Velloso, Marcelo Ramos aprontou pela primeira vez na nossa casa e sofremos uma derrota inexplicável.

2. Palmeiras 3 x 4 Vasco/RJ
Copa Mercosul/2000 (20.12.2000) - 31.700

Esta é provavelmente a virada mais impressionante já vista entre grandes clubes brasileiros. Do jogo, me lembro da euforia do intervalo e da incredulidade após cada gol cruzmaltino. Depois do jogo, o mais difícil era consolar cada um dos palestrinos que deixavam o estádio e chegavam, já desolados e destruídos, ao bom e velho ponto de ônibus da rua Venâncio Aires. Voltamos todos em um silêncio sem precedentes. Ainda hoje, quase 10 anos depois, lembro de cada curva da volta para casa: não veio nem o 875H nem o 874T; tivemos de voltar de 407M, encarando todo o caminho pelo centro da cidade. Foi uma noite muito longa...

 1. Palmeiras 2 (3) x 2 (4) Boca Juniors/ARG
Copa Libertadores/2001 (13.06.2001) - 32.000

Fomos roubados de maneira descarada em Buenos Aires, no jogo de ida. Um crime qualificado, reconhecido por todos. Ainda assim, conseguimos um empate em 2 a 2 na Bombonera. Na volta, um Palestra lotado, festa, time empolgado. Mas Riquelme, em noite inspirada, leva o Boca a um 2 a 0 ainda na primeira etapa. A torcida vê o time perdido em campo e volta a incentivar. Pouco depois, Fábio Jr. completa um cruzamento de Arce. GOL! Mas vem o bandeirinha, um safado, e anula o gol. O time continua na luta e chega, ainda no primeiro tempo, ao 1 a 2: Fábio Jr.. Mas persistia a indignação do torcedor: dois deles invadem o campo, um deles (o Zeca) acerta uma bela voadora no safado e o jogo é interrompido. No retorno, ficamos com um a menos: Alexandre é expulso e deixou o Palestra envolto naquele clima inebriante de uma derrota quase certa: o silêncio cortante, gente se jogando no chão, os músculos paralisados, o vento frio cortando as poucas esperanças, o terror de se ver eliminado antes da hora. Vendo que as coisas estavam perdidas, a torcida faz do Palestra um caldeirão no segundo tempo. Com um a menos, o Palmeiras pressiona. Córdoba pega tudo, de todos os jeitos imagináveis. O empate vem aos 21 minutos da etapa final: escanteio batido por Arce, desvio de Bermudéz, GOL! 2 a 2, de novo. Vamos aos pênaltis, de novo. Caímos, de novo. Contra o mesmo rival do ano anterior, nas mesmas circunstâncias, na véspera do mesmo feriado, em outra noite fria de junho. Caímos. A dor fica para sempre, não é? Se serve de consolo, deixo aqui uma reflexão: imaginem só o que doeu no SCCP as eliminações que impusemos a eles em 1999 e 2000?

***

Depois disso tudo - e essas foram apenas as derrotas mais contudentes, quase sempre resultando em eliminações ou perda de títulos -, pergunto: que outra torcida resistiria a tanta tragédia em tão pouco tempo? E para vocês, leitores, quais seriam os 10 jogos?

04 junho 2010

A volta do Gladiador


Kleber, o Gladiador, está de volta! Se é mesmo verdade (isso pressupõe acreditar no comunicado oficial da nossa diretoria), significa que ele vai reencontrar a torcida alviverde na noite de quinta-feira, 15 de julho, em um clássico no Pacaembu contra os moleques mimados do Santos FC. Vê-lo com a camisa 30 em campo não será o bastante; a volta só estará consumada quando for desferida a primeira cotovelada, talvez naquele moleque imbecil que veste a 7 dos SFC. É um bom presságio, diga-se.

A volta do Gladiador ao lugar de onde nunca deveria ter saído (só a Traffic não pensava assim) recoloca muita coisa no devido lugar. É um presente para o palmeirense, tão sofrido e tão carente de ídolos. É também um reconhecimento à identidade que se criou muito rapidamente entre jogador, clube e torcida. Aliás, considerando o fato de este blog, ao contrário de outros, nunca ficar na mesmice, eis aqui uma leitura particular dos fatos:

Kléber chegou ao Palmeiras como um ilustre desconhecido, como um achado da nossa diretoria (é justo reconhecer). Ficou no Palmeiras só nove meses, mas a identificação foi imediata, como poucas vezes antes. Kléber virou ídolo um pouco pela carência do torcedor, um outro tanto devido às boas atuações a ao título conquistado naquele ano, mas essencialmente pelo perfil guerreiro, batalhador, lutador. Era o ‘bandido’ que todo time de bem precisa ter em suas fileiras.

Os números não dão conta de explicar a idolatria instantânea. Em nove meses, foram 47 jogos, 12 gols, muitos cartões amarelos, algumas expulsões, um cotovelo na cara de um zagueiro adversário e mais alguns de brinde para outros rivais e inimigos.

Vejam os senhores que foram “apenas” 12 gols em 47 jogos, média de um a cada quatro jogos. É pouco, dirão as estatísticas, mas o que elas encobrem é a importância dos gols. Porque, ao contrário de certos atacantes firuleiros, Kléber não é do tipo que acumula gols inexpressivos contra rivais menores para então sumir nas decisões contra os grandes: o Gladiador é autor de gols grandiosos e quase sempre decisivos.

Kléber começou a fazer seus gols logo na estréia, em uma virada emocionante contra a Ponte Preta no Palestra: 2 a 1, dois dele. Foi virar ídolo ainda em março, em outra virada, desta vez no clássico contra o SPFC em Ribeirão Preto: veio dele o gol do empate para a construção dos 4 a 1. Além disso, mandou uma bela cotovelada na cara de André Dias. O Gladiador deixou sua marca em outros duelos importantes: o 1 a 0 da primeira final do Paulista, em Campinas, e mais um no 2 a 2 contra o SPFC, já pelo Brasileiro, no Palestra, só para ficarmos em exemplos mais contundentes.

A ida para BH foi daqueles episódios difíceis de assimilar: Kléber não queria ir, o Palmeiras não tinha dinheiro para segurá-lo, a Traffic não quis investir, e os ucranianos fizeram então a besteira de mandar Kléber como moeda de troca para a contratação de um zé-ninguém do time mineiro. Ele foi a contragosto, e deixou isso bem claro, tanto quanto o desejo de voltar para o Palmeiras.

Durante o ano e meio a serviço do Cruzeiro, Kléber apresentou números muito mais expressivos: 38 gols em 58 jogos, com direito a duas participações na Libertadores. Isso tudo, no entanto, não se traduziu em idolatria, em identificação ou seja lá o nome que vocês quiserem dar. Não deu liga.

Seja bem-vindo, Gladiador. Aqui é a sua casa!


03 junho 2010

Bendita Copa do Mundo

Não, eu não estou louco, e o título acima não representa uma mudança brusca de opinião. O que acontece é que a Copa do Mundo chega em ótima hora para o Palmeiras. Difícil acreditar que as coisas possam piorar além do nível atual, e os 40 dias sem jogos podem servir para que algo de bom aconteça para o nosso lado.

Precisamos de técnico (as substituições do senhor Parraga contra o Flamengo foram absurdas), precisamos de atacantes (só o Kléber não resolve), precisamos de meias (o senhor Cleiton Xavier parou de jogar), precisamos de um lateral-esquerdo (o tal do Eduardo é uma fraude), precisamos de dirigentes (isso não se resolve agora), precisamos de sorte (são poucas as chances criadas, mas, quando elas vêm, tudo dá errado). Precisamos de quase tudo; só o que temos é um santo no gol, a boa vontade de uns e outros e o torcedor palmeirense na arquibancada.

A derrota sofrida nesta fria madrugada de quarta-feira ofuscou o clima propício da nossa nova casa, o Pacaembu. O público foi pequeno, é bem verdade, mas era nítido entre os torcedores que lá estivemos a disposição de empurrar o Palmeiras, mesmo com o cenário adverso. Mas a bola não quis entrar no primeiro tempo, o jogo se arrastou, o nosso técnico deixou o time sem meias e, num contra-ataque, aconteceu o pior, pelo pior pé possível.

O clima de funeral depois do gol dos mulambos é reflexo do Palmeiras atual. Frio na metrópole, madrugada, véspera de um feriado quase sempre indigesto, mais uma derrota em casa, três jogos sem marcar gol, um time acéfalo em campo. O lado bom? Não choveu.

Dirão alguns que, para piorar, temos o Internacional/RS na próxima rodada, lá no Beira-Rio. Eu discordo. É melhor pegar o Inter agora. Porque esse é o tipo de jogo em que podemos contabilizar uma derrota, esteja o Palmeiras bem ou mal. Em sendo assim, melhor encarar a derrota agora, com o time mal, para buscar um novo caminho depois da Copa. Aliás, bendita Copa do Mundo.

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Quanto a Kléber, vou repetir os dois comentários quase unânimes entre os palestrinos presentes ao Pacaembu:

1. Se o Perrela falou, podemos começar a levar a sério o eventual retorno do Gladiador. Porque os nossos dirigentes não têm mais crédito; até o Perrela é mais confiável.

2. Só acredito na volta do Kléber quando ele entrar em campo com a nossa camisa e meter uma bela de uma cotovelada em algum adversário. Em outras palavras: só acredito no retorno dele quando vier a primeira expulsão.

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Como é bom estar no Pacaembu... Será a melhor casa possível na ausência da nossa casa. Mas vamos lamentar por muito tempo a falta dos bares nas redondezas e mais uma série de coisas que serão tratadas no próximo post. Até lá.