Um inoperante torcedor de sofá jamais conseguirá compreender o significado de ir ao estádio e levar seu time à vitória em um duelo menor. Ao se contentar com a imagem pasteurizada da TV, suas mil opções de câmeras e seus comentaristas ignóbeis, o sofá deixa de conhecer toda a essência do futebol.
Essência que reside não em uma partida final, com seu potencial alienante de aglutinar gente de toda espécie, mas sim em um Bragantino x Palmeiras como o de ontem.
Jogo de superação, de público reduzido (R$ 32 de ticket médio?) e de participação incisiva do torcedor palmeirense, que pôs o time da casa no seu devido lugar.
Do início aterrador, com 0 a 2 no placar e um homem a menos, ao 5 a 2 final, muito pouco fica na memória do torcedor de sofá. Talvez o orgulho momentâneo por uma reação comovente. Algo que passa em dois ou três dias, até a próxima transmissão ao vivo.
Bem diferente do que é vivido na decadente e decrépita cancha de Bragança Paulista, a mesma que, sabe-se lá como, já abrigou uma final de Campeonato Paulista.
Mais do que apenas cantar músicas de apoio e buscar na garganta a força para uma virada heróica, o que vale é ter o poder de colocar em seu devido lugar personagens que passam batidos para o sofá.
Como Nunes, o medíocre centroavante do time interiorano. Para quem não se lembra, foi este o energúmeno que promoveu uma quase tragédia no Pacaembu na final da Copa SP de Futebol Júnior de 2003. Cinco anos depois, pouco mudou.
Restou pouco da provocação sem propósito após o segundo gol. O inconseqüente camisa 9 de Bragança saiu de campo sob ira da torcida alviverde, revitalizada após cinco gols em seqüência.
Para os que ficamos atrás do gol, grudados ao muro e ao alambrado do Marcelo Stéfani, o inimigo principal era o menos provável: o gandula. Não apenas um, por sinal, mas três, todos os que tiveram de fazer rodízio por ali depois de não agüentarem a saraivada de ofensas, impropérios e ameaças.
Para o sujeito que prefere não se arriscar a pegar a estrada e pagar R$ 40 para ficar de pé ao lado de um banheiro químico, é difícil compreender a sensação de quem acredita ter levado o time à vitória só pela pressão sobre os gandulas, figuras quase insignificantes para o que se passa dentro de campo.
De fato, é.
A minha imagem desta virada épica em Bragança nunca será nítida e cristalina, como a da TV. Será, pelo contrário, entrecortada por elementos vários: o muro alto, o alambrado, a grua da Globo e o seu operador, os intermináveis segundos entre o percurso da bola do peito à ponta do pé do Valdívia, o revezamento de gandulas, os policiais que tiveram de conter a nossa ira, as placas de publicidade, a garoa...
Nada confortável, admito. Mas quem precisa de conforto quando se pode sair pulando feito louco após um gol que, devido às placas de publicidade à frente, só se soube gol pela experiência de tantos anos de estádio? Quem precisa de TV quando se vive o êxtase de uma virada improvável? Quem precisa de sofá quando escalar um alambrado enferrujado serve para ilustrar a certeza de ter transpirado tanto quanto os que estavam dentro de campo?
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Pobre Bragantino
Pobre do time que vive sob os caprichos da família Chedid. De um Nabi que já se foi, mas que continua a ostentar seu nome por todas as partes (“Nabi é Braga”, “Eternamente Nabi” etc.). Ou de um Marquinho Chedid que circulava ontem pelas cercanias do estádio ou pela numerada do Marcelo Stéfani a ordenar a funcionários terceirizados que reduzissem a inevitável desordem bragantina.
Tudo isso por R$ 40 a arquibancada, preço burro, responsável pelo público de apenas 6.617 pagantes. Mais burro que o preço, só mesmo a divisão entre as torcidas. Afinal, se os R$ 40 tinham o objetivo de aproveitar o grande número de palmeirenses na região, por que destinar à nossa torcida apenas um setor da arquibancada?
Para finalizar, deixo aqui uma pergunta: como pode o Canindé estar interditado e o Marcelo Stéfani não?